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A profecia na contemporaneidade à luz do Pensamento de José Comlbin

 

Introdução

 

É com alegria que aceito novamente o convite para escrever nesta revista. E minha alegria ainda é maior dada a atualidade o tema da Profecia que revelam mais uma vez a pertinência e a atualidade de José Comblin, quem tomarei de base para desenvolver esta reflexão.

No primeiro artigo que publiquei aqui, refletimos sobre a visão e as contribuições do pensamento de José Comblin a vida religiosa e para tanto àquele momento para enriquecer a reflexão me utilizei artigos que ele mesmo havia publicado nesta revista. Contudo para o tema que agora tratamos da Profecia, utilizarei uma metodologia mais livre. Caminharemos também por textos comblinianos, publicados em outros espaços, bem como utilizaremos documentos da Igreja notadamente LG. Desta maneira creio que podemos oferecer ao leitor uma visão ampla e didática sobre o tema.

  1. Profetismo em história

Igual que em termos filosóficos, na Teologia a caminhada e a compreensão do profetismo e o que o compõe não foi linear. Não pretendemos aqui dissertar com detalhes toda sua trajetória, mas propor elementos essenciais que traga a luz compreensão desta. O fazemos notadamente para que seja base de compreensão para o item seguinte de nosso texto que tratará do profetismo na América Latina, onde se situa D. Paulo Evaristo.

O Concílio Vaticano reabilitou os carismas entre os quais o Profetismo. Em sua reflexão o Espírito Santo age na Igreja a partir de duas vertentes: o magistério e os carismas. Ora, durante muitos séculos não se falou em profetismo na Igreja, porque durante séculos o papel da ação do Espírito ficou restrito à hierarquia e ao seu trabalho de condução do povo de Deus. Por isso, o regaste do Espírito Santo com ação universal, realizado pelo Concílio ampliando-o aos carismas foi essencial (LG,4).

Mesmo se o Concílio não explica o papel da profecia, confundindo-o com o papel do Magistério (LG,25), revelando um significado muito distante do bíblico, nessa mesma constituição (LG,31) esse cita a missão profética dos leigos, referindo-se ao papel de seu testemunho no mundo. Permanece distante do sentido bíblico, uma vez que reduz esse profetismo ao ato de ensinar como reforçado em Apostolicam Actositatem (AA). Da mesma forma, mesmo sem falar a palavra profecia, Unitatis Reintegratio (UR) chama a atenção da necessidade da crítica profética da Igreja pelos que estão dentro e fora dela (UR,4), da necessária reforma contínua da Igreja justamente porque ela é constituída por pessoas (UR,6).

Sabidamente, Deus dá o carisma independente da função eclesial que a pessoa ocupa na Instituição. De fato, o Espírito Santo atua livremente sobre todos os cristãos, e os carismas que dele procedem, não tem direcionamento do humano.

José Comblin em seu estudo sobre a profecia (Comblin, 2009), ressalta que entre todos, Paulo o Apóstolo, destaca a profecia, como o que é o mais útil para Igreja. O Espírito orienta a sua Igreja também pelos profetas e é essa a afirmação do Vaticano II que abre uma etapa absolutamente nova para o futuro da Igreja (Comblin, 2009, 10). Nesse sentido, não está entre as tantas preocupações do profeta brigar por lugar na hierarquia, ou eliminá-la. Antes, sua preocupação maior está em reconhecer na realidade a compreensão de cada momento, já que a revelação não mostra como o Evangelho deve ser vivido em cada momento da história. Estes devem ser descobertos e é o Espírito que mostra o caminho por diversos meios, inclusive através dos Profetas. Não sem razão, o Credo afirmará: “O Espírito que falou pelos profetas” e não afirmará o Espírito que foi dado aos que pertencem a Hierarquia.

Por isso, para Comblin, o papel do profeta não consiste em enunciar ou explicar a doutrina revelada, mas está em descobrir e dizer como se aplica essa revelação em determinada situação e em determinado lugar e tempo. Ele é dotado de sensibilidade para perceber o que está acontecendo, “perscrutar os sinais dos tempos”, identificando onde está o pecado e por onde pode vir a salvação e a ordenação em qualquer grau, não confere essa sensibilidade. Esse dom não é adquirido ou desenvolvido ou até mesmo permanente. O carisma é dado pelo Espírito para o tempo determinado por ele.

Profecia e profetas revelam características próprias vindas do Espírito. Se a primeira se dá pela continuidade da história, a segunda se dá para toda a vida, isto é permanentemente. Nesse sentido, profecia não é opcional, não é puro discurso e nem desistência fácil. A profecia se constitui em ação pública e de visibilidade, em política e pública e por isso o mais importante está em que o profeta não fala apenas por palavras, mas fala com toda a sua vida. Ser profeta por inteiro dá credibilidade à profecia.

A segunda característica é a que o profeta dirige-se ao povo e presta-lhe um serviço. Este não é preso as estruturas eclesiais ou políticas e, ainda que eventualmente pertença a elas, não as exclui de seu reconhecimento positivo ou negativo. Por isso denuncia a corrupção, seja do povo de Deus, seja das instituições.

Colocando-se face aos dois, arrisca-se a despertar a ira de ambos. Por isso a terceira característica é o risco da perseguição, o maltrato que pode sofrer e por vezes, de forma intensa que pode levar a própria morte. Por consequência, o profeta vive em permanente insegurança, porque não sabe o que vai acontecer e a experiência de seus predecessores invariavelmente, mostra os riscos de sua missão. Anunciar a fidelidade de Deus a seu povo e exigência de reciprocidade a essa fidelidade é também sinal de fortalecimento da minoria, que se mantém fiel a Deus e a si mesmo.

Comblin destaca ainda que ao longo da história da profecia e das diversas perspectivas eclesiológicas revelaram dois tipos de profetas: o verdadeiro e o falso, e essas características ajudam a identificá-los. A história da profecia é influenciada por contextos eclesiológicos e cada época revela essas diferenças. Contudo, o critério primeiro se dá pelo parâmetro da proximidade com o real significado da profecia nos textos bíblicos. O AT revela em toda sua história que os profetas de Israel sempre foram a principal referência e constituíram o modelo do profetismo. Na teologia católica pós-tridentina, os profetas do AT perderam efetivamente espaço na reflexão original e a realização de milagres e sinais passou a ser o parâmetro para identificação de profetas e finalmente foram postos na função do anúncio do evento da chegada do Messias. A apologética tridentina influenciou e reduziu o papel dos profetas a sinais e previsões, sem relações concretas com a realidade de seu tempo.

Ora, os estudos exegéticos, baseados no método histórico-crítico, permitiram o redescobrimento do sentido da profecia em especial na América Latina. Associado à mudança do modo de presença de Igreja no continente, a profecia assumiu seu real valor na teologia LA. Resgatou-se as relações entre os profetas do AT e a nova atividade de Igreja no continente. Com efeito, isso não quer dizer que toda a Igreja latino-americana tenha assumido essa perspectiva, porém não se pode negar que os profetas foram lidos e comentados nas Cebs, porque davam apoio às atividades públicas das comunidades. Essa mesma leitura teve como consequência direta o alargamento da compreensão da historicidade de Jesus. A visão profética de Jesus era sua atividade histórica e pública em meio ao povo.

Claro está que “evento Jesus” não elimina nem substitui a importância dos profetas do AT, ao contrário, os ilumina e desvela suas mensagens e imagem. Seguramente no NT, Jesus aparece como profeta: realiza gestos e muitas de suas palavras somente se compreende dentro da lógica da profecia. É isso que nos permite afirmar que a lógica se inverte: é Jesus quem nos permite salientar o valor permanente dos profetas do AT.

A diversidade dos ministérios

Nas primeiras comunidades fica clara a diversidade dos ministérios. Além de presbíteros, diáconos e bispos, apresentam-se também os profetas. E isso nos permite questionar e reforçar a compreensão da liberdade de ação do Espírito de Deus. De outra parte, isso questiona também a estrutura vertical na qual a Igreja se configurou. Onde nesta hierarquia encontram-se os profetas, se esses não são nomeados e nem recebem o seu poder de uma hierarquia instituída?

À medida que a Igreja se integrou a estrutura romana, oficialmente os profetas desapareceram. A essa integração preservou-se a classe do clero dedicada à religião, ao culto e às normas. Nessa estrutura o clero assumiu o papel de sagrado, como donos de gestos e das palavras sagradas e isolando-se cada vez mais do Povo de Deus. Segundo Comblin, “ com o tempo, uma casta que se renova por cooptação, sem nenhuma intervenção do povo” (Comblin, 2009, 17) e acrescento eu, para o povo. A relação de dependência com o Império pagou o alto preço da perda da profecia.

O desaparecimento da ordem dos profetas permitiu o aparecimento de personalidades, que mesmo sem o título, reassumiram de fato o papel dos profetas. No Séc. IV, houve bispos tais como S. João Crisóstomo, S. Gregório Nazianzeno, São Basílio e Santo Ambrósio, que tiveram atuação semelhantes a dos profetas, sendo defensores da justiça e dos pobres, enfrentando autoridades e as classes dirigentes do Império. Posteriormente, podemos citar Francisco de Assis e Domingos de Gusmão. A partir da contestação ao modelo eclesial vigente, sobretudo a riqueza do clero, ambos chamam à Igreja ao retorno à realidade, ao cuidado com o destinatário central do evangelho: o pobre.

Aliado a esses, de certa forma aparecem também os reformadores. Não se pode negar que a Reforma teve como um dos primeiros impulsos, a contestação da riqueza, vista como fontes de todos os vícios e corrupções na Igreja. Pergunto-me se necessitariam ter deixado a Igreja mãe? Não podemos responder, mas também não podemos negar a legitimidade de suas denúncias. O endurecimento por parte de João XXII (1316-1334) e a condenação dos Franciscanos Espirituais agrava a perseguição aos movimentos de pobreza, tendo esse termo sido eliminado da hierarquia. Finalmente os herdeiros profetas da Idade Média foram expulsos da Igreja, não foram ouvidos e considerados heréticos. Após Trento, durante mais de 300 anos deixou de existir na Igreja a preocupação com a justiça e os pobres (Comblin, 2009, 24).

A colonização da América Latina ainda registra indícios dessa compreensão. Ainda que chegassem aqui missionários franciscanos e dominicanos, e os primeiros chegaram antes de Trento, a Igreja encontrou-se durante 250 anos na dependência das monarquias, que a reduziram à função de legitimar a dominação colonial e a de criar uma cultura nova, centrada no ambiente tridentino, destinada a esmagar as culturas dos povos colonizados.

Contudo, houve missionários que souberam elevar a voz em favor desses povos. Foram poucos em relação a quantidade dos que chegaram no continente, é verdade, mas seus gestos iluminaram posteriormente o pensamento da Igreja da Libertação de Medellín. São eles, Bartolomeu de las Casas, Antonio de Montesinos, Vasco de Quiroga, João de Zumárraga, e o primeiro bispo mártir Antônio Valdivieso (PB,8), que lutaram contra a cobiça e a violência dos conquistadores.

No dinamismo da História, a Igreja não entendeu a mudança de contexto que se abre no Séc. XIX, com o nascimento da Indústria e a formação de um proletariado, dominado em situação de quase escravidão. (Comblin, 2009, 26). Ela estava preocupada por demais em não perder os privilégios, face ao risco da ruptura Igreja x Estado e com a manutenção da igualdade de um único modelo de Igreja pelo mundo. Segundo sua perspectiva, as esmolas resolviam a questão dos pobres. Os profetas que surgiram nesse período quase todos foram condenados pela Igreja. Leigos como Frederico Ozanam, e alguns da hierarquia, como o padre belga Daens, que acabou excomungado pelo Bispo de Gant/Bélgica.

Na América Latina a industrialização começou mais tarde, é verdade, mas aí também a Igreja chegou atrasada. Os operários acharam antes o socialismo que substituiu a Igreja que os havia abandonado. Pio X acaba por fazer aliança com a burguesia de seu tempo contra o mundo socialista. Cria a Democracia Cristã alimentada pela Ação Católica, do tipo franco-belga, é dizer Ação Católica especializada, alimentada pelo método de trabalho de Joseph Cardjin. Após a Segunda Guerra mundial, alguns católicos quiseram mais que a Ação Católica. Contudo, Pio XII tornou impossível toda a transformação da Igreja, e sua herança tornou quase impossível a recepção e o alcance das reformas propostas no Vaticano II (O”Malley, 2008,135).

Porém, como os carismas e o dinamismo da Igreja são de propriedade do Espírito e não de homens e mulheres, esse agiu novamente às vésperas e durante o Concilio. Houve vozes verdadeiramente proféticas como a Henri Godin, que publicou France un pays de mission? , houve teólogos com vocação profética que fizeram o Concílio, tais como Yves Congar, M-D Chenu, entre outros que condenados por Pio XII foram resgatados por João XXIII, que a sua vez, também foi um profeta. (O”Malley, 2008,141).

Ainda que o Vaticano II não possa ser considerado um Concílio profético, nele se manifestou outras vozes como a do cardeal Lercaro de Bolonha que vez apelos brilhantes em favor dos pobres, o que levou a constituição do Grupo da Igreja dos Pobres (Sauvage, 2017, 520) no Concílio capitaneados por D. Helder, D. Ancel (França) e D. Himmer (Belga), que teve como gesto mais significativo o Pacto das Catacumbas.

Um fato porém é determinante: os verdadeiros profetas referem-se sempre aos pobres e à conivência com que a Igreja se coloca a favor dos poderosos. Esse é o parâmetro determinante para distinguir o verdadeiro profeta. Não há profetismo em uma Igreja acuada pelo poder, ou associada a ele. Nesse caso o que há é traição à prática de Jesus e ao humanismo de Deus.

Ao contrário de todos os humanistas (filosóficos gregos e teológicos escolásticos), Deus mesmo nos dá sua definição e a nós, somente resta nos submetermos a seu critério humanista: os pobres. Os textos mostram que os pobres, os que buscam a João Batista e depois a Jesus, são os que estão à parte da sociedade por diversos motivos, inclusive o econômico (Comblin, 1974,84). E é a eles, que desde o AT Deus ouve seu clamor e que no NT Jesus se dirige prioritariamente. A partir do humanismo de Deus, se pode afirmar que o Evangelho cristão é uma boa nova para os seres humanos em situação específica: aos que estão em situação de escravidão, de menosprezo, fora da sociedade Afirma Comblin: “Ora, o horror da escravidão não gera a liberdade. A liberdade é uma aspiração nova na humanidade” (Comblin, 1998, 21).

E Jesus se dirige a eles não somente porque têm pouco, mas é justamente o fato de terem pouco é que os tornam abertos a sua mensagem. O pouco ou nada que têm, permite ver no Nazareno o que muitos outros personagens bíblicos, a exemplo de Nicodemos, um Doutor da Lei, não conseguiu enxergar: a nova forma de vida e de relações fraternas. Enxergar o projeto de Jesus exige mudar o olhar, tirar as capas de proteção cultural, religiosa e cultual para enxergar o outro, prioritariamente ao que está à parte da sociedade.

Ora, se Deus e Jesus o fazem, porque deixamos nós de fazê-lo? A modernidade matou a profecia, ou ela nunca foi tão necessária e nós a deixamos de lado? Não nos faltam no Séc. XX homens e mulheres que impulsionados pelo ES souberam se valer de sua voz profética. Foi a geração de bispos que surgiu na América Latina na segunda metade do Século XX. Esses acabaram, sem nenhuma intenção, por formar ao que Comblin denominou “Os Santos Padres Latino-americanos” (Comblin, 2009, 203) tendo como principais: D. Oscar Romero (El Salvador); os Jesuítas assinados na UCA entre os quais Ignácio Ellacurría, D. Enrique Angelelli (Argentina); D. Juan Girardi (Guatemala); D. Carlos Horacio Ponde de Leon (Argentina); nossos D. Hélder Câmara; D, Paulo Evaristo Arns e D. Luciano Mendes de Almeira, D. Leonidas Proaño (Equador), Sérgio Mendes Arceo (México), Manuel Larraín (Chile); Alberto Hurtado s.j (Chile). E os leigos, Clotário Blest (Chile); Adolfo Perez Esquivel (Argentino) Rigoberta Manchú (Guatemala). Muitos outros poderiam ser citados e cada um a seu tempo soube enxergar em seu contexto a necessidade de defesa dos sem defesa.

  1. Os profetas da atualidade

Um ponto comum em toda a história da profecia é que os profetas se levantam do meio dos pobres. Isso não quer dizer, como vimos nos exemplos anteriores, que tenham nascidos pobres, mas sim, que tenham tornado-se solidários a eles. É a vocação que é profética e não a situação de origem. A solidariedade, a aproximação, o esforço pela compreensão do contexto é o que faz a base da profecia e o exercício do profeta, e não sua condição de origem. Aliás, deixar uma condição de origem rica para entregar-se aos pobres é por si só um gesto profético. E é importante que se deixe claro também, que nem todos que se instalam no mundo dos pobres tornam-se automaticamente um profeta, contudo a vocação profética somente pode surgir em seu meio.

O desafio encontra-se então em “como” estar no meio dos pobres. É isso que descobre um profeta. Pobre é o que não falta nesse mundo, e pelo que vemos não temos nenhuma perspectiva de solucionar essa questão. Desde o século passado, esses começaram a ser gerados pela condição econômica: eram os que ficavam fora do processo de modernização e futura globalização da AL, e na sequência por questões políticas: eram os excluídos da sociedade por condenar sistemas políticos que avalizavam os sistemas econômicos. A divisão do mundo em classes não é bem o problema. Porém, a pretensão de dominação de uma classe a outra é o que gera a exclusão. Se existissem classes distintas, mas solidárias, talvez não houvesse excluídos.

Os gestos proféticos se fazem necessários uma vez que até hoje´vivemos em uma sociedade de pobres sem voz, em uma realidade dividida entre pobres e ricos até hoje . O continente LA continua constituído por grandes cidades divididas em subcidades que revelam grandes contrastes entre pobreza e riqueza. Os bairros ricos têm toda estrutura ao passo que as periferias, sem nenhuma condição, seguem crescendo, ainda que em menor ritmo que nos anos 60, quando de sua constituição. Ainda há o povo que insiste em ficar no campo, continua sem assistência adequada, ao passo que grandes latifundiários vivem de sua exploração com todo conforto. Em definitivo, evoluímos pouco dos anos 80 aos 2017.

E o papel da Igreja hoje? Ora, se essa Igreja se instala em um andar superior da realidade, de onde sairão os profetas? Se a nova configuração eclesiológica desde então, tende a atender primeiros aos que já têm todas as condições; aos movimentos que fechados em si mesmos praticam mais as orientações dos fundadores do que o Evangelho de Jesus; se seus responsáveis aparentemente dão testemunho de uma vida contrária a dos pobres e somente lhes encontram em condições e situações muito especiais, de onde virão efetivamente os profetas? Se a vida deixa de ser celebrada nos cultos e esses se tornam simples referências simbólicas, onde os pobres encontrarão Deus? Será necessário neste espaço de Igreja local, repensar com urgência, o sentido entre Igreja e Evangelho de Jesus?

Em limitando a consciência profética hoje, como ficará a profecia no futuro? Ou como afirmará Comblin: “Com efeito, hoje a força da Igreja está concentrada ao redor de dois pólos: os movimentos e as paróquias. (...) Os movimentos estão implantados no mundo dos incluídos. Toda sua forma de ser revela a perfeita adaptação à cultura dos incluídos. Por ser emanação da cultura dominante, os movimentos não têm comunicação com o mundo dos excluídos, mesmo que seu discurso multiplique as profissões de boa vontade”. (Comblin, 2000,12). São muitas as perguntas decorrentes do abandono dos pobres por parte da Igreja.

O profeta é a voz dos que não têm voz, e essa somente pode vir do contato com os pobres. A voz deve falar o que a realidade demanda, deve anunciar a essa realidade, a possibilidade de transformação real pelo Evangelho através de ações conjuntas com os pobres. A voz do profeta deve dar aos pobres a consciência de quem têm condição de reconstruir seus espaços e sua identidade. Afinal, o quê Jesus deu aos pobres de seu tempo a não ser uma identidade que lhes permitia seguir de outra forma? Aliás, os pobres podem falar por si sós, mas honestamente falando: sozinhos foram alguma vez escutados? Vide as realidades gritantes que se encontra nas periferias da cidade de São Paulo.

Conclusão

A marca da profecia deixada na história da Igreja Latino Americana nasce de homens e mulheres que assumem essa vocação até as últimas consequências sem diferenciar em suas vivência do Evangelho o que é fé e vida. Ao contrário, as vivia plenamente entendendo a ambas como composição de integridade das dimensões humanas as quais todos fomos chamados a viver, mas prioritariamente os pobres, aos quais atendeu com palavras de esperança em seus encontros, acolheu com abraço sincero, incentivou à esperança e, sobretudo, verdadeiramente os amou. Igualmente urge em AL, a valorização de grandes “profetas anônimos”, homens e mulheres que assumem sua vocação vivem a dedicação em defesa dos pobres, dos valores do Evangelho e da fidelidade ao seguimento de Jesus.

Alzirinha Souza

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Leiga, Dr. Teologia Université Catholique de Louvain

Profa. Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP

 

 

Questões

  1. A profecia em última instância é uma das perspectivas da Prática de Jesus. Na região em que você atua, o Evangelho vem sendo vivido de forma Profética?

  2. Há em sua região, profetas anônimos, que sustentam e motivam a caminhada do Povo de Deus ?

  3. Quais são as demandas que exigem um exercìcio profético de denúncia ?

Bibliografia:

Comblin, José, A maior esperança, Petrópolis, Vozes, 1974, p. 84.

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_____ Vocação para a liberdade, São Paulo, Paulus, 1998.

_____ A Igreja e o mundo dos excluídos, In: Revista Vida Pastoral 211 (2000), p. 12.

____ A profecia na Igreja, São Paulo, Paulus, 2009.

Forte, Bruno, A essência do cristianismo, São Paulo, Vozes, 2003.

Susin, Luis Carlos, Resistência das alteridades como possibilidade de pluralismo. Conferencia pronunciada em 08/10/2012 em São Leopoldo – Brasil - no Congresso Continental de Teologia Latino Americana. Disponível em: http://www.ustream.tv/channel/congresoteologicobrasil. ( Acesso em em 06/05/2017).

O’Malley, John, L’événement Vatican II, Bélgica, Lessius, 2011.

Sauvage Pierre, Gênese, évolution et actualité de la théologie de la libération. In : Cheza Maurice, Martínez Luis et Sauvage Pierre, Dictionnaire Historique de la Théologie de la libération, Bélgica, Lessius, 2017, p. 509-622.

 

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