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A CONTEMPLAÇÃO DO CRUCIFICADO NOS INTERPELA CONTRA A CULTURA DA MORTE

Após verem Jesus ressuscitar Lázaro, uns acreditam, outros correm para denunciá-lo aos fariseus (Jo 10,31-42). Qual é delito de Jesus? Desde quando é crime reanimar os mortos? É evidente que Jesus não é um delinquente. O mesmo Pilatos dará testemunho disso quando admitirá não ter visto alguma culpa nele. Para Fariseus e Sumos Sacerdotes Jesus é um subversivo. “Se deixamos que ele continue assim, todos vão acreditar nele, e virão os romanos e destruirão o nosso lugar santo e a nossa nação” ((Jo 11,48). O crime dele é ameaçar seus privilégios e colocar em xeque “seu lugar”, anteposto ao bem da nação. Suas palavras e seus gestos colocam em discussão o sistema que lhes garante a manutenção do poder através de uma religiosidade que manipula as consciências e as dobra a seus interesses. Caifás, sumo sacerdote vira mandante de assassinato. À diferença de Jesus que devolve a vida, ele sentencia morte. Sem nunca fazer referência ao Deus da vida e Sua Palavra, como deveria ser pela  função religiosa que reveste, propõe a solução que desagrada o Deus de Jesus e favorece os interesses de seu grupo: “É melhor um só morrer pelo povo do que perecer a nação inteira” (Jo 11,50). Eis aqui um evidente exemplo de tanatopolítica. É a típica política de Estado cujo objetivo é eliminar fisicamente os opositores pelos meios mais cruéis e diversos. “A tanatopolítica mostrou sua face mais perversa nos regimes totalitários como o nazismo, o fascismo ou stalinismo, assim como em regimes ditatoriais e autoritários como as ditaduras militares da América Latina... Porém, infelizmente a tanatopolítica não se restringe a este tipo de regimes, pois a política de definir a morte de alguns, considerados perigosos ou ameaçadores, para que a vida de outros tenha tranquilidade e seja bem-sucedida faz parte, por exemplo, da nova política internacional, e de muitas políticas de segurança pública” (Castor Bartolomé Ruiz) . No Brasil não é diferente. Os modelos econômicos, políticos, ideológicos e, infelizmente, religiosos dominantes desprezam a vida e eliminam fisicamente ou moralmente, através da violência, do preconceito, da mentira e da difamação, todas as pessoas que constituem um entrave a seus perversos projetos. O lema deles é “Vita mea est mors tua!” (a minha vida é a tua morte).

Para realizar seu propósito de morte, os fariseus e sumos sacerdotes montam uma farsa processual. A decisão está já tomada. Jesus deve ser justiçado de forma infamante através da crucificação pública para que o mundo todo veja e nunca mais ouse desafiar o sistema de poder. O processo, portanto, torna-se uma dissimulação. A decisão já está tomada. É um caso de lawfare. A lei não serve para fazer justiça, mas é usada para alcançar os objetivos do grupo dominante. A história, inclusive recente, está cheia destes casos. É de desanimar. Mas, como diz o povo, “o tiro sai pela culatra”. Como bem sublinha o evangelista João, o ato tanatopólitico de Caifas torna-se uma profecia. Jesus não morre pelos interesses dos grupos dominantes, mas pela nação. E não só pela nação, mas também para reunir os filhos de Deus dispersos e fazer deles um novo povo com o qual assina uma aliança de paz ((Jo 10, 51,52). A morte de Jesus, portanto, longe de ser uma derrota, é uma denúncia contra todo sistema de morte que atravessa a história. A Sua cruz ereta no Calvário e pendurada abusivamente nos centros de poderes desmascara a violência do sistema, traz a memória das vítimas, gera compaixão nas pessoas de boa vontade e envergonha aquelas que persistem na cultura da morte.  Olhando para seu corpo crucificado e, através dele. para o corpo martirizado de todas as vítimas da violência, reajamos com indignação diante de tamanha violência, solidarizemos com as vítimas, cuidemos delas, desmascaremos os algozes e lutemos pela civilização do amor. “Quando se mostram de forma explícita as consequências da violência à condição das vítimas, a violência se torna intolerável. O rosto desfigurado das vítimas opera como uma espécie de antídoto crítico para que a violência não se naturalize e nossas consciências não sejam alienadas pelos dispositivos de normalização” (Castor Bartolomeu Ruiz). É isso que o Crucificado espera de seus discípulos e suas discípulas. (pe. Xavier Paolillo)    
 

Referência: Entrevista com Castor Bartolomeu Ruiz in http://www.ihuonline.unisinos.br/artigo/7270-a-producao-de-violencia-e-morte-em-larga-escala-da-biopolitica-a-tanatopolitica

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