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Desbravando caminhos: uma herança de Jesus

Juliana Henrique

A luz advinda das atitudes/obras de Jesus chega até nós por meio dos registros/testemunhos. As atitudes/obras nos ensinam ter a fé dele num Deus que é pai (e que é mãe).

Ele ousa DESBRAVAR caminhos ainda não percorridos, ousa arriscar, ousa ir na contramão da sociedade para garantir a dignidade e a reinserção social das pessoas excluídas e marginalizadas de sua época.

Em Lucas 4, 17-21 Jesus faz a leitura do profeta Isaias 61, mas se formos comparar os textos observaremos que ele realiza alterações do texto original para adequar a sua realidade. Pergunto: Você já realizou alterações no texto para atender a sua realidade social? Não? Pois é chegada a hora. Jesus nos dá autoridade, vejamos o evangelho segundo João 14, 11-14:

Creiam em mim: estou no pai, e o pai está em mim. Se não conseguem crer nisso, creiam no que veem – minhas obras. Quem confia em mim fará não apenas as coisas que eu faço, mas poderá até mesmo fazer coisas maiores, porque eu, em meu caminho para o pai, dou a vocês o privilégio de fazer a mesma obra que tenho realizado. Podem contar com isso. De agora em diante, tudo que pedirem, em conformidade com o que eu sou e faço, vou conceder a vocês. É deste modo que o pai será visto: pelo que ele é no filho. É isso que quero dizer. Seja o que for que pedirem, se for desse modo, vou fazer por vocês.

Na época de Jesus as pessoas marginalizadas e excluídas eram as: cegas, leprosas, prostitutas, mulheres em período menstrual ou com hemorragias, cobradores de impostos entre outras. Tal situação era baseada nas leis de pureza e de impureza. Existiam situações que deixavam as pessoas impuras, majoritariamente composta por pessoas empobrecidas. E não era só isso. A pureza tinha um custo alto. Quer saber como funcionava? Vamos lá,

Para o povo do tempo de Jesus, a observância da pureza era uma luta difícil e angustiante! Bastava um toque com algo impuro, por menor que fosse, e a pessoa já ficava impura, por mais pura que fosse antes. Como uma bola de sabão! Tocou, estragou! Por exemplo, tocar em sangue, tocar num leproso ou comer carne de certos animais tornava impuro (Lv 11, 1-30; 17, 15; At 10, 11-14). Entrar na casa de um pagão tornava impuro (Jo 18, 28). Comer com um não judeu ou um samaritano tornava impuro (At 10, 28). [...] O impuro era sempre mais forte e levava vantagem. A pureza do povo era uma pureza ameaçada, acuada, frágil, sem defesa. E não era só isso! A observância da pureza custava muito dinheiro! Por exemplo, caso um animal impuro passasse por cima de um prato ou pote de barro, estes ficavam impuros e deviam ser destruídos (Lv 11,33), A lagartixa era considerada animal impuro (Lv 11, 30). Dá para evitar que lagartixa passe por cima do pote? Caso um animal impuro passasse por cima do forno ou um animal morto caísse lá dentro, o forno deveria ser destruído (Lv 11, 35). Uma barata morta obrigaria a destruir o forno! Para que uma pessoa pudesse ser declarada curada de qualquer doença de pele, ela devia fazer a oferta de ao menos um cordeiro (Lv 14, 21). A manutenção da pureza custava muito dinheiro! Por isso, para o povo trabalhador era praticamente impossível viver e trabalhar e, ao mesmo tempo, manter-se na pureza exigida pela lei. (MESTERS, 2013, p.25-26)

Então, de forma breve, acabamos de ler sobre as leis de pureza e impureza, situações que marginalizavam e excluíam pessoas. Situações que hoje em dia nem esquentamos como a “impureza” da barata e da lagartixa, são leituras da época que precisam ser ressignificadas ou até extintas. Logo observamos que a leitura da bíblia precisa de uma leitura libertadora que restaure a dignidade e a reinserção social das pessoas. Jesus interfere em favor das minorias na questão do cumprimento da Torá: coloca a vida acima da lei na defesa da mulher adúltera (Jo 8, 1-11), mas faz valer a Torá quando, por meio de uma parábola, se percebe que o direito da mulher viúva está para ser violado (Lc 18, 1-8)(REIMER, 2005, p.68 ) Pergunto: Hoje, quem são as pessoas excluídas e marginalizadas, por pessoas religiosas, por serem consideradas impuras? Citarei algumas e você vai acrescentando, são elas: mulheres (que não podem ser ordenadas), gays, lésbicas, pessoas transexuais, bissexuais, profissionais do sexo, pessoas com HIV, e... Acredito que um dia isso será superado e que novas categorias surgirão e serão interpretadas como impuras diante da lei.

Basta de discursos hipócritas, excludentes e discriminatórios pautados nos registros da Bíblia, existem experiências que precisam ser ressignificadas para construirmos um mundo mais fraterno, acolhedor e justo. Logo, “é preciso anunciar a libertação para encorajar outras pessoas e denunciar a opressão para gerar processos de TRANSformação.” (REIMER, 2005, p.12)(fonte alterada por mim)

A herança deixada por Jesus faz-nos enfatizar as palavras do profeta Jeremias 1:10 “Vê, HOJE te confiro, autoridade sobre as nações e sobre os reinos, para arrancar e derrubar, para arruinar e demolir, para construir e plantar.”



Juliana Henrique

Autora do livro Sobre a natureza da religião

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