Alder Júlio Ferreira Calado
À parte benditas exceções, tal vem sendo a distância tomada pelas Igrejas cristãs, na contemporaneidade, em relação às suas fontes autênticas, que suas ações se confundem, não raramente, com forças tenebrosas que prevalecem no atual contexto separadas da Tradição de Jesus. Por suas próprias fontes, em vez de protagonizarem, como são chamadas a fazê-lo, iniciativas luminosas ("vocês são a luz do mundo") comprometem-se com frequência com grupos e pessoas obscurantistas; em vez de empreenderem ações transformadoras ("vocês são o fermento na massa"), perdem força e credibilidade aos olhos de quem ousa lançar sementes de mudança, nas mais distintas áreas de atuação; em vez de se comprometerem como iniciativas de caráter alternativo (“vocês são o sal da terra”), militam, por vezes, ao lado de forças que não cessam de lançar no mundo sementes de ódio, de prepotência, de dominação…
Consolam-nos, por outro lado, múltiplas ações desenvolvidas por parcelas minoritárias - “as minorias abraâmicas”, de que falava Dom Helder Câmara - que não se cansam de testemunhar e de clamar pela conversão de suas respectivas igrejas. Com efeito, desde os primeiros tempos, e por séculos a fio até o presente, fazem-se presentes profecias e segmentos eclesiais. A despeito de seus limites, seguem emitindo gratos sinais e testemunhos de fidelidade à tradição de Jesus, várias Marias, inclusive a mãe de Jesus, e Maria Madalena.
A pelo menos meio século, vem se intensificando, com reconhecida qualidade, os estudos e pesquisas desenvolvidos por teólogas feministas, conferindo um olhar feminino/feminista na interpretação e na exegese dos textos bíblicos (vetero e neotestamentários). Igualmente digna de nota vem sendo a experiência comunitária e orante e contextualizada da leitura da Bíblia, em consonância com os significativos achados nas pesquisas realizadas. Neste campo muitos registros bíblicos relidos com olhar feminino ou feminista têm vindo à tona, com resultados surpreendentes, de modo a sinalizar uma atuação do sopro Fontal inovador, que se vem experimentando. Muitas interpretações ancoradas apenas no olhar machista e patriarcal foram - e ainda continuam sendo - largamente naturalizadas, em claro prejuízo do protagonismo das mulheres. Citemos, de passagem, alguns casos que permitem ilustrar constatação. Graças a estas pesquisas, é possível identificar aspectos bíblicos que passam frequentemente despercebidos a um olhar androcêntrico, em detrimento da participação ativa das mulheres no movimento de Jesus e ao longo da tradição apostólica. Isto se pode observar diante de passagens fortes do Evangelho, como no episódio da Ressurreição de Jesus, que não permite subestimar o papel de Maria Madalena como discípula predileta de Jesus, inclusive devendo-se tratá-la como "a Apóstola dos Apóstolos". E, no entanto, que lugar costuma ser reconhecido a Maria Madalena, entre os demais apóstolos?
A situação se agrava consideravelmente, a partir do século quarto, da era constantiniana, inclusive desde o Concílio de Nicéia (325), pelo Imperador Constantino convocado e presidido, de forma escancaradamente contrária ao Espírito do Evangelho. Bem mais recentemente, uma simples observação feita pelo Cardeal Leo-Jozef Suenens, presidia a uma das aulas conciliares do Concílio Vaticano II, solicitando aos seus pares que olhassem para os seus lados, perguntando-lhes da presença feminina, naquele recinto. O Cardeal teve um gesto inspirado e inspirador, no sentido de exortar os seus pares quanto à gravíssima desigualdade dos sujeitos eclesiais, de modo a conferir apenas a homens o direito ou privilégio de decidirem sobre assuntos da Igreja Católica Apostólica Romana, em âmbito Universal, como se a igreja fosse composta apenas de varões. O fato de o Cardeal Martini, na sua última entrevista, não ter hesitado em afirmar que nossa igreja estava 200 anos de atraso, só confirma a urgência de profundas reformas que se tornem efetivadas, em nossa igreja, se ela está mesmo disposta a ser fiel, não ao Imperador Constantino ou aos valores do império romano (seja o do Ocidente, seja o do Oriente), mas ao evangelho.
A despeito de que parte expressiva da bibliografia disponível sobre a história da igreja encontram-se, contudo, textos luminosos, escritos por historiadores e historiadoras do Cristianismo, que apresentam uma percuciente descrição e análise de como, sobretudo após o século quarto, fecundas experiências comunitárias das primeiras comunidades cristãs foram cedendo lugar a um reduzido grupo clerical, que passa progressivamente a distanciar-se do Povo cristão tal como antes organizado em comunidades espalhadas por várias regiões. Comunidades cristãs que, conforme o relato dos Atos dos Apóstolos, célebres textos patrísticos, dão conta do clima fraternal e do espírito de solidariedade e de serviço reinantes entre aquelas comunidades. A sede de poder logo passou a seduzir certo número de clérigos, de modo a torná-los cada vez mais uma casta controladora das grandes decisões do conjunto do Povo cristão até então. O que se observava era uma disposição de convivência fraterna, de partilha, de solidariedade, ausência hierarquizante,em que pese a diversidade de funções a cargo de certos membros da Comunidade - diáconos, presbíteros e bispos, a exercerem suas funções como serviço a causa do Evangelho, e não como pretexto de mandonismo e de autoritarismo.
Neste sentido, o Concílio de Niceas (325) sob o controle do Imperador Constantino, constitui um marco importante deste crescente distanciamento entre os membros comuns das comunidades cristãs e outros que se insurgiram como mantenedores do poder de decisão, ainda que a revelia ou em clara oposição aos princípios da Tradição de Jesus.
Tanto antes quanto sobretudo depois deste Concílio de nicéia (325), uma sucessão de medidas vem a ser tomadas, com o objetivo de consolidar pela força, inclusive. Neste domínio tornaram-se célebres disputas sanguinárias, suborno, luxúria, e outros graves desvios, que tiveram lugar nesta época, protagonizada por figuras papais, exemplo de Sérgio III ( ? - 911), João XII (937 - 964), Bento IX (exerceu o pontificado 3 vezes, entre 1032 e 1048), Gregório VII (1015/1020 - 1085), Inocêncio IV (1195 - 1254), Bonifácio VIII (1230 - 1303), Alexandre VI (1431 - 1503), Júlio II (1443 - 1513), Leão X (1475 - 1521), Clemente VII (1478 - 1534), e vários outros, não hesitavam em formar exércitos para disputarem o poder temporal com outros reis e príncipes da época. Nestas ocasiões, tais figuras papais não hesitavam em apresentar como argumento estratégico a suposta ascendência do poder espiritual sobre o poder secular (dos príncipes). Notabilizou-se, igualmente, o episódio envolvendo o próprio período em que Celestino V exerceu o papado, função, à qual renunciaria seja pela cupidez das atitudes tomadas por quem lhe sucederia, com o nome de Bonifácio VIII, seja em função do perfil de Celestino V, um eremita, destituído completamente de apelo ao poder papal.
Acerca de episódios similares, não é à toa que, em sua famosa Comédia, Dante coloca Bonifácio VIII como um dos integrantes do inferno, ao lado de outras figuras envolvidas em incursões violentas pelo poder. Papas, cardeais, bispos e outras figuras do clero eram constantemente acusados de envolvimento em vários episódios de luxúria, de devassidão, venda de indulgência, de corrupção. Reiteradas e sanguinárias lutas pela pretensão e supremacia do poder espiritual sobre o poder secular, assassinatos, estupros, torturas, proteção dos interesses familiares contra os direitos dos demais - tudo o que contraria a fonte principal da fé cristã. Uma simples consulta a páginas antológicas do Evangelho (por exemplo, o Sermão da Montanha, capítulos 5 a 7. e, Marcos 10,42- 45. e João Capítulo 10 e tantas outras passagens) é suficiente para se ter noção das barbaridades então praticadas, e mais graves ainda, por serem obras dos que se colocavam como sucessores dos Apóstolos. Quem se der ao trabalho de consultar a biografia dos Papas acima referidos, terá a oportunidade de confirmar estes crimes, praticados nos séculos 11 ao 13, justamente um período em que ficam essas figuras monstruosas, é que se dá o início de uma estrutura eclesiástica, fundada na cega obediência aos ditames do papado, a organização hiper hierarquizada, mecanismos jurídicos tais como Código de Direito Canônico, a organização em diocese e paróquias, em suma, o cerne da organização eclesiástica que comanda a caminhada da Cristandade, durante séculos. Nunca é demais assinalar que, mesmo durante os mais sangrentos períodos de luta pelo poder, inclusive por meio das Cruzadas e da implantação do uma análise mais percuciente desta realidade, nas diferentes tramas de seus fatos e acontecimentos, requer de nós não apenas um olhar sobre árvores individualizadas, mas também um olhar sobre a própria floresta. Implica, portanto, um exercício multidimensional; requer uma especial atenção para se fazer uma conexão objetiva entre as partes e destas com o todo e, uma relação mais cuidadosa entre os próprios fatos e acontecimentos analisados; requer, ainda, um olhar que tome em conta as idas e vindas deste processo, isto é, ele não se faz de modo linear, por meio de uma evolução retilínea. mas antes, aos trancos e barrancos, em um entrechoque desses fatos e acontecimentos. Neste sentido, cumpre-nos ir além de uma análise que se detenha nos malfeitos estritamente individuais, isto é, de modo a sublinhar a responsabilidade individual pelos malfeitos cometidos, mesmo em se tratando de pontífices. Conduz-nos, antes, a um exame do processo como um todo. Estruturalmente se desenvolve, sempre tomando-se como baliza ou parâmetro os critérios nucleares ditados pela fonte primeira de nossa fé, o Evangelho, a Tradição de Jesus. Sendo assim, várias questões podem e devem ser levantadas:
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Sendo a igreja composta por sujeitos plurais, mulheres e homens, quais tem sido os protagonistas essenciais destes feitos?
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É da natureza da Tradição de Jesus, a partir mesmo dos relatos neo testamentários, este modo androcêntrico e patriarcal de organização das comunidades cristãs animadas por Jesus?
Não devemos esquecer nem subestimar a profética resistência de figuras tais como a de Francisco de Assis, Gioacchino da Fiori, Fra Dolcino, Pedro Valdo, Jane Huss, Thomas Nüntzer, Margarete Porète, de vários movimentos populares, como o das beguinas, em busca de fazer valer a tradição de Jesus contra as monstruosidades da hierarquia.
A este propósito, aliás, vale destacar que não se trata de apregoar ou sugerir uma igreja composta de pessoas puras. São outros os critérios que o próprio Jesus de Nazaré utilizou ao escolher seus discípulos e discípulas. Os apóstolos, por exemplo, eram partícipes de vários estratos sociais, eram pessoas simples e portadoras de defeitos, inclusive Pedro, que acabou por traí-lo e abandoná-lo, arrependendo-se e convertendo-se ao Caminho. Trata-se, porém, de reconhecer, não apenas a gravidade dos crimes cometidos por estes Papas, mas também de constatar sua indisposição para a conversão.
Por outro lado, importa ressaltar os valores que a tradição de Jesus mais inspira e destaca em seus discípulos e discípulas, em especial aqueles e aquelas a quem incumbe de missão especial. Com efeito, o Projeto de Deus incarnado em Jesus, ao partir de pessoas simples, pecadoras, gente comum, nelas confia e fornece Luz e Força para, a despeito de seus limites, enfrentarem e vencerem os obstáculos que se lhes interpõem.
No entanto, partiram de figuras papais deste gênero, iniciativas de organização do seu poder, estreitamente inspiradas na estrutura do Império Romano, em clara demonstração de sua insensibilidade e de seu compromisso com as primeiras comunidades cristãs e, sobretudo, com o modo próprio de organização comunitária vivenciado e anunciado por Jesus de Nazaré. Venceu, infelizmente, a estratégia destas figuras papais, impondo uma estrutura eclesiástica conforme seus interesses de poder. O papado passa, desde então, a figurar como uma estrutura eclesiástica centrada em uma monarquia, para o que também contribuíram formas de organização e de sustentação deste poder Eclesiástico, bem ao modo do Império Romano. Dentre as principais organizações eclesiásticas, inspiradas no Império Romano, além do próprio papado,, também fazem parte as formas organizativas em dioceses e paróquias. Uma marca relevante da chamada Cristandade, que vem atravessando séculos sem que, apesar de sucessivas convocações de concílios, pouca coisa se tenha alterado desta estrutura, inclusive em nossos dias. Ainda hoje, enquanto o Brasil se vê fortemente atingido por uma alta letalidade da COVID-19 (atingindo uma média diária superior a 1000 mortes), graças inclusive, à grave omissão do governo Bolsonaro, eis que circula a notícia, pelo jornal Estadão, de São Paulo, dando conta da proposta de sacerdotes em apoio ao governo Bolsonaro, em troca de vantagens e outorgas para sua mídia conservadora. Cf: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,por-verbas-tvs-catolicas-oferecem-a-bolsonaro-apoio-ao-governo,70003326526. Procedimentos similares devem ser estendidos também a outras igrejas cristãs, como a do Pastor Silas Malafaia.
Graças a esta avidez de poder, por parte dos que investiram na criação do papado, é que se deu a cisão entre a igreja Católica, bifurcada a partir de então, entre Igreja Católica do Ocidente, sediada em Roma, e a Igreja Católica do Oriente, a qual seguiu organizada com um perfil pluriforme diversificado, sem subordinação a um único chefe, mas situando-se em vários pontos do Oriente, tendo como referência um patriarca, que mantém uma relação fraterna com outros patriarcas, referências de unidade em outros centros. Ao contrário desta posição, a Igreja Católica no Ocidente, motivada por um desejo de centralização, passou a investir no papado como único modo de governar a Igreja Católica Romana. O mais grave desta história é que, além da cisão provocada, seus chefes investiram seu trabalho em um projeto de acumulação do poder temporal e do poder secular, mesmo a custa de muitos conflitos Sangrentos (o exemplo das Cruzadas), em diversas regiões da Europa a partir desta orientação que pouco ou nada tem de inspiração evangélica nem da Patrística. Seus chefes (os Papas), rodeados de cardeais e de bispos, além de suas alianças com reis e príncipes, cuidaram de erigir uma estrutura imperial de governança, recorrendo a mecanismos de poder tais como o Código de Direito Canônico, as Dioceses, as Paróquias, além de uma complexa estrutura central feita à base de um Estado, comportando Ministérios - os chamados Dicastérios ou Secretarias, Setor Diplomático, estrutura financeira ( Banco do Vaticano), entre outros aparelhos de governança.
Sem embargo, não se tratou de uma governança monolítica e sem discordâncias e mesmo contestação. Ao longo dos séculos posteriores, diversas foram as experiências proféticas e missionárias, protagonizadas pelas "minorias abraâmicas", resistirem a tal estrutura, por entenderem distanciada da fonte maior do movimento de Jesus, o Evangelho.
Ainda em meados do século passado, especialmente a partir dos anos 40, pontificaram diversas experiências proféticas, tais como a "Mission de France", fecundo legado dos padres operários, bem como uma vigorosa e fecunda produção teológica, a clamar por profundas mudanças na organização da Igreja Católica Romana. O Concílio Vaticano II constituiu o desdobramento principal deste movimento de renovação eclesial. Convocado em 1959, pelo Papa João XXIII, o Concílio Vaticano segundo realizou-se de 1962 a 1965 trazendo alguns avanços. Em relação à pesada estrutura até então vigente, disto dão testemunho seus 16 documentos conclusivos, em especial 4 constituições: a que se refere à Palavra de Deus ("Deiverbum"), a que trata da Liturgia(" Sacrossanctum Concilium"), a que abordava o significado e a renovação organizativa da igreja (" Lumen Gentium") e a que buscava empreender um diálogo com o mundo moderno ( " Gaudium et Spes ").
No entanto, muitas pendências não puderam ser propriamente enfrentadas, dada a posição conservadora da enorme maioria dos Padres conciliares. A experiência conhecida como "o pacto das catacumbas "constitui um notável exemplo de resistência e de convocação a uma verdadeira Igreja dos pobres, expressão cunhada por João XXIII.
A despeito da Profética iniciativa do pacto das catacumbas, inspirador da II Conferência Episcopal Latino-Americana, realizada em Medellín (Colômbia), em 1968. Isto, contudo, não conseguiu imprimir mudanças significativas na mentalidade dos principais grupos de decisão, em âmbito da direção da Igreja Católica Romana. Certo é que, mais de meio século após a realização do Concílio Vaticano II, não se conta com mudanças de fundo na estrutura eclesiástica, em que pese o fecundo esforço Profético que vem sendo envidado pelo atual Bispo de Roma, Francisco.
São, com efeito, conhecidas sucessivas medidas que Francisco, Bispo de Roma, desde o início de seu pontificado, há 7 anos, vem desenvolvendo, no sentido de sensibilizar e de comprometer os vários organismos da Igreja Católica Romana e seus diferentes dirigentes, em busca de reformas relevantes, a começar pela atualização dos documentos do Concílio Vaticano II. Não apenas em suas dezenas de viagens apostólicas, pelos cinco continentes, mas também por frequentes pronunciamentos, por escritos de referência ( sua encíclica social, suas Exortações Apostólicas) correspondem a um franco atestado. Mais do que isto, seu próprio testemunho de Bispo de Roma, empenhado em desencadear uma série de alterações na Cúria Romana, nas estruturas pouco ou nada evangélicas características do modo organizativo da Igreja Católica Romana.
De Francisco, Bispo de Roma, são igualmente conhecidas as reiteradas tentativas de alguns de seus predecessores e auxiliares. O Papa João XXIII constitui uma referência a não perder de vista. O Cardeal Martini, em sua última entrevista, lembrava a urgência de reformas nas estruturas eclesiásticas, que ele entendia estarem em atraso de 200 anos. Juntamente com estas testemunhas, há por certo figuras notáveis do episcopado, do clero, em busca da concretização destes apelos. Igualmente, há de se ressaltar o entusiástico apoio da parte de leigas e leigos religiosas e religiosos, alguns deles constituídos em organismos autônomos, empenhados na mesma direção. A exemplo - para citarmos apenas dois casos - a da Organização das Religiosas dos Estados Unidos (LCWR) e a do Movimento Internacional Somos igreja.
Entretanto, somos obrigados a constatar as dificuldades quase intransponíveis encontradas, nesta busca de reformas da/na Igreja Católica Romana. Aqui, ali, algumas alterações pontuais e relativamente secundárias, mas, no cerne da estrutura, quase nada se vem conseguindo.
Estas observações valem, consideradas as ressalvas necessárias e as proporções, em relação ao conjunto das igrejas cristãs: além da Igreja Católica Romana, devem estender-se, no que é cabível, também as Igrejas Ortodoxas e as Igrejas Reformadas.
Em uma de tantas entrevistas concedidas pelo teólogo José Comblin, uma delas foi concedida a um jornalista da Radio Bio Bio, em Santiago no Chile, há mais de 10 anos. Nela, o teólogo, perguntado sobre o que deveria ser mudado na igreja católica Romana, ele não hesitou em começar por dizer: "Todo..." À parte sua força de expressão, convém não subestimar tal entendimento, sobretudo quando se põem em exame as distâncias consideráveis entre a estrutura dessas igrejas e o espírito do Evangelho, em que todas dizem inspirar-se. Eis porque, a seguir, propomos a reflexão de vários pontos, em forma de perguntas que nos podem ajudar neste caminho, nesta busca:
Qual a fonte principal em que todas as igrejas cristãs confessam inspirar-se?
Como justificar o grosso de suas respectivas estruturas organizativas, a partir dos valores axiais do Evangelho?
Como, no início da tradição de Jesus, se organizavam as primeiras comunidades, em comparação com o formato organizativo característico das Igrejas Cristãs, mais de 2.000 anos depois?
É sustentável seguir uma estrutura visivelmente em processo de caducidade e de atraiçoamento aos princípios elementares de suas respectivas Fontes?
Será que, após sucessivos episódios de fracasso, na realização de mudanças necessárias, por parte das respectivas hierarquias, é possível restringir o processo de mudança às medidas tomadas de cima para baixo?
Como sensibilizar e comprometer melhor os sujeitos eclesiais, em seu conjunto, em especial os e as que não exercem seu legítimo de direito de participarem das respectivas decisões fundamentais?
Do conjunto de sujeitos plurais, no amplo espectro das igrejas cristãs - Igreja Católica Romana, Igrejas Católicas Ortodoxas e Igrejas Reformadas - como assegurar lugar nos organismos de decisões às mulheres, membros majoritários em todas estas igrejas?
Que medidas e que instrumentos e meios de convocação e de reunião deliberativa (concílios, sínodos) podem e devem ser concebidos e tentados, a médio e longo prazos, nesta direção?
João Pessoa, 06 de junho de 2020