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PAPA FRANCISCO FALA A UMA IGREJA SURDA: A DEFICIÊNCIA TEOLOGICA E POLÍTICA NA IGREJA

 

                                                                              Pe. Gedeon José de Oliveira.

Em seu discurso por ocasião da visita ao Oriente Médio, o Papa Francisco diz o seguinte:

“Queridos irmãos e irmãs,

Obrigado pelas vossas palavras! Agradeço-lhe, Senhora Presidente, a presença e as suas palavras. Irmãs, irmãos, vim de novo aqui para vos encontrar. Estou aqui para vos certificar da minha proximidade, e faço-o com o coração. Estou aqui para contemplar os vossos rostos, para ver-vos olhos nos olhos. Olhos cheios de medo e ansiedade, olhos que viram violência e pobreza, olhos sulcados por demasiadas lágrimas. Há cinco anos, nesta ilha, o Patriarca Ecuménico e querido Irmão Bartolomeu disse algo que me impressionou: «Quem tem medo de vós, não vos fixou nos olhos. Quem tem medo de vós, não viu os vossos rostos. Quem tem medo de vós, não vê os vossos filhos. Esquece que a dignidade e a liberdade transcendem o medo e a divisão. Esquece que a migração não é um problema do Médio Oriente e do norte da África, da Europa e da Grécia. É um problema do mundo inteiro» (Discurso, 16/IV/2016).”

Neste discurso algumas palavras chaves nos chamam atenção do sentido e do significado do “OUVIR”, a saber: proximidade, ver, contemplar, rosto e dignidade. Ouvir é uma palavra que está presente na maioria dos documentos do Papa Francisco. A sínodo proposto pelo Papa ao mundo, pressupõe o ouvir. Mas o que significa OUVIR?

Uma das contribuições filosófica de Heidegger, ao campo da teologia, foi pensar o sentido de OUVIR. A pergunta pelo OUVIR, vai marcar o campo da espiritualidade Cristâ na modernidade.  Estar em toda parte e em tudo, o perguntar, se torna saudade da pátria como totalidade efetiva fundamental do filosofar” (HEIDEGGER, 2011, p. 6). A pergunta que se faz numa atitude do auscutar (do latim, ausculto, significa dar ouvidos a) torna possível o mostrar-se e o reconhecer da nostalgia profunda do útero materno que se preserva. Não se escuta o simples barulho ou as ondas sonoras do que está sendo dito, mas o sentido originário de DEUS. Sendo assim, ao invés de ouvir, dá-se o ouvido. Se não fossem os obstáculos impostos pelo neoliberalismo, ouviríamos a terra dizer: vocês são meus filhos. Ouve-se no silêncio o que fala Deus, de modo que o calar fala mais alto. Neste sentido, auscultar é um modo de pensar o ser caminhando.

O pensamento de Papa Francisco, é propriamente pensamento quando se dá uma “escuta” e nela se dá pertencimento ao Deus da vida, quando Jesus já se destinou, se enviou, já foi admitido. O pensamento é propriamente pensamento quando há um pertencimento a Deus, pertencimento ou apelo; quando o pensamento se faz desde o próprio Deus e esse apego pode ser também um amor ao querer OUVIR.

Então, o poder ser que é querer OUVIR e querer somente isso. Querer é, portanto, deixar ser, deixar DEUS vingar desde a proveniência de sua essência e esse querer é amar; amar como querer é deixar ser, deixar Deus falar, deixar vigorar. Uma igreja deficiente, usa o poder como modo tirânico sobre o outro. Daí, ouve a si mesmo não havendo fronteira entre instituição e Estado. A surdez não percebe que o poder não é o de ter domínio sobre Deus: é deixar Deus acontecer desde ele mesmo. Ouvir Deus é deixar o poder de Deus agir para se tornar um poder libertador. Assim, poder como querer é justamente o deixar ser, portanto o possível, que é somente possível.

“Compreendemos que as grandes questões devem ser enfrentadas em conjunto, porque, no mundo atual, são inadequadas as soluções fragmentadas. Mas, enquanto as vacinações se estão a efetuar fadigosamente a nível planetário e algo parece mover-se, embora por entre inúmeros atrasos e incertezas, na luta contra as mudanças climáticas, tudo parece baldar-se terrivelmente no que diz respeito às migrações. E, no entanto, há pessoas, vidas humanas em jogo. Está em jogo o futuro de todos, que, só poderá ser sereno, se for integrador. Só se aparecer reconciliado com os mais frágeis é que o futuro será próspero. Pois quando são repelidos os pobres, repele-se a paz. Fechamentos e nacionalismos – a história no-lo ensina – levam a consequências desastrosas. Com efeito, como recordou Concílio Vaticano II, são «absolutamente necessárias para a edificação da paz (…) a vontade firme de respeitar a dignidade dos outros homens e povos e a prática assídua da fraternidade» (Gaudium et spes, 78)”

O pensamento quer se fazer instrumento exclusivo de um poder tirano a pergunta sobre o “OUVIR” vem a ser expressão da técnica, aí acontece o eminente naufrágio de uma experiência desancorada de um mundo sem origem e sem pátria. “A saudade da pátria é tonalidade afetiva fundamental do filosofar e as perguntas por mundo, finitude e solidão” (HEIDEGGER, 2011, p. 6) encontram no silêncio sua resposta efetiva, e partir disso se dá o pensamento. Isso não depende, todavia, da autonomia dos bispos ou padres, de poder controlar e de determinar a igreja como uma propriedade, isso também ocorre com os empobrecidos. As assembleias pastorais de várias dioceses, são construídas sem ouvir os grupos organizados, negligenciando as necessidades e gritos dos que sofrem o desmando do Estado. Utilizam os documentos do Papa Francisco, para dar uma satisfação ao público de unidade, quando na verdade, os documentos do Papa servem apenas para mascarar os interesses políticos e ideológicos objetivando inviabilizar o projeto de Igreja em saída. É desolador perceber os mecanismos que muitas dioceses utilizam para militar contra o Papa Francisco. Não querem e não desejam OUVIR Deus que fala desde os empobrecidos. Um Deus que se encarna na história exige mudanças históricas tendo como referencia as vítimas.

O auscultar é o desejo de si que prepara a transferência do OUVIR de Deus para o plano histórico: mundo e homem, não se tem nenhuma representação. Sem auscultar a Deus, a pessoa não tem gênero, não tem história. A pessoa não é nada, portanto, reduzida a mero instrumento da religião.  Nesse tempo de avento, que o OUVIR, do Papa Francisco, no contagie a rezar e nos transformar em ouvidores das necessidades do povo, em especial dos grupos organizados pela luta da terra, luta por vacinas, luta por reconhecimento de gênero. Ouvir é deixar o outro falar de si mesmo.

“Agora rezemos a Nossa Senhora para que nos abra os olhos aos sofrimentos dos irmãos. Ela pôs-Se a caminho apressadamente para ir ter com a prima Isabel, que estava grávida. Quantas mães grávidas, apressadas e em viagem, encontraram a morte enquanto levavam no ventre a vida! Que a Mãe de Deus nos ajude a ter um olhar materno, que veja nos homens filhos de Deus, irmãs e irmãos que devemos acolher, proteger, promover, integrar e... amar ternamente. Que a Toda Santa nos ensine a colocar a realidade do homem antes das ideias e das ideologias, e a mover, rápido, os passos ao encontro de quem sofre”. (Papa Francisco)

 

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